quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Conversas em família e a apropriação de discurso próprio como saúde mental

Trago para você a reflexão sobre a qualidade de comunicação em situações de relação interpessoal nos momentos de convivência familiar – se é que isso ainda existe na sua realidade. De qualquer forma é importante que saiba que o encontro da família em torno de uma atividade conjunta como compartilhamento da refeição pode ser altamente positivo para a dimensão de qualidade de vida porque perpassa por conversas que podem ser classificadas como intimistas quando se reúne familiares à mesa.

Tal situação é extremamente importante para a saúde mental reforçando nas pessoas o que chamamos de instrumentos de socialização: capacidade de externar ideias, problemas e situações, bem como manter um diálogo sobre o assunto, para viabilizar a internalização das experiências vividas. Além disso, a comunicação em família resguarda nos indivíduos a possibilidade de facilitar comportamentos sociais e aumentar a satisfação de vida.
Com o propósito de investigar a associação entre a frequência de jantares de família e dimensões positivas e negativas de saúde mental em adolescentes, Elgar e seus colaboradores, em 2012 obtiveram dados durante jantares em família para determinar se essa associação. Tal hipótese teve que ser explicada pela qualidade da comunicação entre adolescentes e pais nesses processos de interação em momentos do que se pode chamar de convivência social em família.
Os estudiosos selecionaram uma amostra de 26.069 adolescentes (com idade entre 11 a 15 anos) para participarem em 2010 do estudo Canadense de Saúde e Comportamento de Crianças em idade escolar. Como método de condução da pesquisa, foi solicitado que os adolescentes dessem dados de em forma de autorrelato sobre a frequência semanal de jantares de família, a facilidade que sentiam sobre a comunicação entre seus pais e os jovens participantes. Os dados foram analisados a partir de cinco dimensões da saúde mental (internalização e externalização de problemas, bem-estar emocional, comportamento pró-social, e satisfação com a vida). Análises estatísticas de testes de acerca das dimensões de saúde mental com autorrelatos promoveram relações entre jantares de família (comunicação entre pais e adolescentes) e saúde mental.
Perante os resultados obtidos, os pesquisadores concluíram que a frequência de jantares de família está negativamente relacionada com internalização e externalização de sintomas e positivamente relacionada ao bem-estar emocional, comportamento pró-social, e satisfação com a vida. Estas associações sofrem interferências com as diferenças de gênero, nível de ensino, ou status socioeconômico da família. No entanto, as análises de posição hierárquica apontam que estas associações foram parcialmente mediadas por diferenças na comunicação entre pais e adolescentes, que explicaram de 13% a 30 % do efeito de jantares de família sobre a saúde mental. Dessa forma foi possível concluir que os resultados, embora estabelecidos por correlações, revelaram uma resposta considerável sobre relação entre a frequência de jantares de família e dimensões positivas e negativas de saúde mental de adolescentes.

Tais resultados foram determinados sobre as análises de relatos de facilidade de comunicação entre adolescentes e seus pais. Nota-se, portanto, que a questão hierárquica e a dimensão negativa entre processos de internalização e externalização nas comunicações familiares são, seguramente, oriundas de barreiras, tabus e dificuldades em relatos de experiências vividas que perpassam, muitas das vezes, por julgamentos de pais acerca das vivências sociais de seus filhos. Tomando como base a sociedade tecnológica e mediatizada por sistemas de comunicação virtual, a questão é: como o indivíduo pode criar desenvoltura comunicativa e um estilo próprio de comunicar se as relações parentais, tão importantes no processo de socialização, surtem efeitos bloqueadores de saúde mental por sobreposição de hierarquia e, acima de tudo, dado o uso excessivo de aparelhos conectados a mídias sociais virtuais, a quase ausente regularidade de companheirismo (leia-se convivência) nas refeições em família?

Referências:
Elgar, Frank J. et al. Family Dinners, Communication, and Mental Health in Canadian 
Adolescents. Journal of Adolescent Health, Volume 52, Issue 4, 433 - 438



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